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segunda-feira, 12 de abril de 2010

Além da compreensão humana

Há coisas que acontecem de uma hora para outra, sem que estejamos preparados para tanto. Na maioria das vezes, eventos desse tipo são bastante negativos. Nos remoemos para tentar compreender e colocar ordem no caos trazido de repente, mas é em vão. A incompreensão só faz aumentar a dor e o sofrimento. Mas por que o fluxo da existência haveria de se importar em deixar claro para nós acontecimentos que por mais que estejam atrelados à nossa experiência, independem de nossa vontade e ação?
A mente humana é dotada de uma tendência natural que sempre busca explicações, busca a ordem, busca organizar os dados e montar o grande e contínuo quebra-cabeças que compõe as experiências de vida de cada um. Esse é um aspecto da natureza, e é também aquilo que nos torna humanos e que nos fez evoluir das cavernas em direção ao mundo de hoje. Interpretado de maneira errada, tal aspecto faz muitas vezes com que o ser humano se encha de orgulho e se coloque no pedestal da superioridade em relação aos demais seres sencientes. Soberba que desmorona diante do simples acaso, diante do inesperado.
A você leitor, acostumado com minhas defesas em favor da racionalidade e da ciência, pode parecer estranho estar lendo isso. Ocorre que a ciência tem seu escopo e é realizada com o objetivo, pelo menos quando os bons cientistas não desprezam a ética, de nos trazer benefícios em escala planetária. A ciência tem as suas perguntas próprias, seus métodos específicos e suas conclusões que devem nos ajudar em algum sentido, dependendo de seu entendimento e aplicação corretos. A ciência não pode e nem intenta responder a tudo. Há mistérios que permanecem, algo que os bons cientistas também reconhecem. Isso nos fornece uma lição de humildade em contraponto ao especismo antes mencionado. Algumas experiências, fundadas com base em teorias totalizantes, tentaram em certos momentos da história aplicar um caráter supostamente científico a cada milímetro da vivência humana. Só poderia ter terminado da pior forma. Mas deixemos isso para lá.
Eu citei os mistérios que estão além da compreensão humana e é isso que me faz escrever hoje. Pudera, uma vez que o inesperado trouxe a mim nestes últimos dias algo gerador de muita dor e sofrimento. Não foi a primeira, nem a última vez. Pensar dessa forma, bem como tentar encontrar amparo em fórmulas projetadas pela religião ou pela autoajuda, é confortável para quem está fora da situação, mas para quem a vivencia, não satisfaz. A mim pelo menos, nunca satisfez, nem tampouco ofereceu consolo.
Por sorte, sou cercado de pessoas muito boas e sua simples presença já é uma ajuda das mais preciosas. Além disso, as reflexões filósoficas também podem servir para que melhor encaremos o sofrimento em momentos como esses.
A impermanência de tudo aquilo que nos cerca é uma realidade. Também é fato que tudo pertence à totalidade que é o universo e tudo retorna a ele e a um novo ciclo de existência. Dessa forma, é correto pensar que a impermanência é, na verdade, apenas a perpetuação de um fluxo que mantém o todo do universo. Esse é outro ponto que igualmente serve para nos transmitir humildade. O universo não considera nossas individualidades, nem os laços afetivos que formamos por nossa conta e responsabilidade durante a experiência vivida. Estamos na maioria do tempo envolvidos no turbilhão de nossos pensamentos, acreditando em ilusões e pouco prestamos atenção em sinais que fugazmente passam diante de nosssas vistas.
A infinitude do universo vem se perpetuando ao longo de éons, eras e períodos. O infinito está também presente em termos de tamanho. Quantos bilhões de galáxias! O que há nelas? Qual é a nossa missão aqui? E a missão de outros seres sencientes? Quantos e quais são os planos de existência? Não sabemos. O certo é que não somos nada diante de tanta imensidão temporal e espacial. Nossa grandeza está no fato de que somos partes desse todo.
No mais, uma convicção: quem não posso ver agora, e que me causa um grande vazio, mais cedo ou mais tarde, em um ou outro lugar do espaço-tempo, estará presente novamente. Obrigado Mitsy!

sexta-feira, 2 de abril de 2010

A Páscoa está ficando cada vez mais chata

No meu tempo de infância eu gostava bastante da Páscoa. Hoje em dia, continuo a gostar, mas esse apreço vem minguando conforme os anos passam. É evidente que não existe nenhum motivo religioso que explique o fato de eu sempre ter gostado dessa época do ano, pois, além de eu não ser cristão, os motivos me parecem ser de fundo bastante subjetivo e abstrato.
Páscoa combina com outono e, quando eu era mais novo, o outono vinha acompanhado de temperaturas bem mais frescas do que o nefasto verão. No início da manhã e ao final da tarde, o inconfundível ventinho outonal já soprava trazendo o agradável frescor que lhe é característico. Ah, o velho outono, tão gostoso! Atualmente, a estação das frutas mais se parece com uma primavera de dezembro, na qual temperaturas elevadas marcam forte presença. O dueto prazeroso, a combinação perfeita entre Páscoa e outono, se tornou algo raro. Esse pode ser um bom motivo que tenha feito quebrar meu encanto pela Páscoa, mas não certamente o único.
A Páscoa que eu aprendi a gostar enquanto criança era uma época na qual o costume - comercial, é claro, mas muito menos do que hoje - de presentear com ovos de chocolate, bombons e outras guloseimas do tipo lhe conferia um aspecto lúdico saudável. Qualquer adulto que, quando criança, pôde receber esse tipo de agrado, jamais irá negar que a expectativa gerada pelo presente de Páscoa sempre foi das mais gostosas, literalmente. Costumávamos ganhar chocolates dos familiares mais próximos e o almoço do domingo era celebrado com uma espécie de alegria calma e portadora de segurança, diferente do que nos dias de hoje as pessoas costumam associar a esse sentimento. A Páscoa possuía um caráter mais familiar, mais recatado, mais austero e, mesmo que o aspecto religioso nunca tenha tido para mim a menor importância, vale pensar que o espírito confidencial da época derivava, em parte, da tradição cristã.
A Páscoa mudou, para pior. A cada ano que passa, observo que o ar familial e tranquilo dessa época perde espaço para o frenesi desritmado da massificação. Ontem passei na porta de uma loja de chocolates e, ao olhar para o interior do recinto, cuja lotação se encontrava bem acima da capacidade daqueles poucos metros quadrados, notei que os fregueses se agitavam loucamente em busca dos presentes de Páscoa. A Páscoa está ganhando cara de Natal, ele que também perdeu sua característica tradicional, embora há mais tempo. Presentear a rodo, presentear a pessoas distantes, uma celebração restrita ao círculo familar transformada em performance social, afeita ao agito das rodas de amigos e do burburinho incessante do bate-papo comum a elas, eis o espírito da Páscoa das massas. Os modismos de nossa era avançaram os tentáculos também sobre a Páscoa que, assim como já vem ocorrendo com o Natal, tornou-se um happy-hour entre amigos.
Não sei como a Páscoa tem sido comemorada em outros países, mas é curioso que no Brasil, em se tratando de situações cotidianas, nas ruas, no trabalho, nos negócios, na educação, nas quais a impessoalidade deveria ser a tona, o que prevalece é a cordialidade. Já nos momentos em que o aconchego da pertença e da identificação afetiva com pessoas próximas é de bom grado, momentos esses que ensejam lembranças de compartilhamento e de histórias comuns, os laços vêm sendo desfeitos. Estranha inversão, também ela responsável por minha indiferença a respeito da Páscoa pós-moderna.
Um criacionista me informou, sem indicar a fonte, que o diâmetro solar tem diminuído conforme o tempo passa. Sem saber dizer desde quando essa suposta redução começou e se ela é constante ou não, ele a defende na tentativa de refutar as explicações ontolológicas baseadas em evidências científicas, com o argumento de que se a Terra existisse há cerca de 4,6 bilhões de anos, um Sol muito mais agigantado do que é hoje teria engolido nosso planeta ou o teria feito torrar a temperaturas altíssimas, além do imaginável. Depois, fiquei pensando que se a redução solar prosseguir num curso linear, daqui a algum tempo, contrariando tudo aquilo que a ciência vem apontando, as temperaturas na Terra irão dimunuir e a Páscoa voltará a se caracterizar por seu ar outonal. Me animei! O criacionismo poderá salvar a Páscoa ...