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quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Um pouco sobre educação, ensino e pesquisa: em defesa de um paradigma democrático e interpretativo, mas também universalizante


Os escritos seguintes são fruto de um pedido de uma colega de trabalho. Ela cursa Pedagogia e as questões formuladas pela instituição superior deveriam ser respondidas por professores, sendo que fui um dos escolhidos para tanto.
Como já expus anteriormente, houve uma época em que eu pensava, ingenuamente, que a educação poderia resolver os problemas do Brasil. Permaneço imbuído da certeza de que uma nação desenvolvida precisa, necessariamente, ser uma nação culta e letrada, perspectiva oposta à concepção pós-moderna, para a qual não existe conhecimento universal independente dos indivíduos e dos pequenos nichos socioculturais nos quais estes se inserem (ou deixam de se inserir...). Assim, de acordo com o pós-modernismo, a educação nos moldes em que se pratica em países como a Finlândia ou o Japão, não é nada mais do que um cânone imposto pela "sociedade capitalista". Abomino o relativismo pós-moderno, tenho ojeriza à guetização que está implicada nesta forma de ver o mundo. Contudo, para alguém que adota o paradigma do liberalismo clássico, como eu, não é exatamente a valorização da educação per se que está em discussão, mas o tipo de educação a ser empreendida. Há algum tempo, concluí que a educação brasileira, como esta se apresenta desde a segunda metade dos anos 1970, - doutrinária e marxista - não só é absolutamente incapaz de promover o desenvolvimento do Brasil, como contribui para torná-lo ainda mais um país atrasado. As respostas que dei para minha colega revelam um pouco desta discussão, por isso resolvi trazê-las até o blog. Seguem abaixo:

1- O que você entende por educação, ensino e pesquisa?
R: A meu ver, a educação, além da construção das habilidades e competências relacionadas à formação mais técnica do aluno, tem muito a ver também com a formação do cidadão, aspecto no qual os valores civis, éticos e morais são parte fundamental. O ensino é um processo de interação entre professor e aluno no qual o conhecimento a respeito tanto da parte técnica da educação, como da parte civil, ética e moral, não passa somente pela transmissão de informações, mas principalmente pela reflexão sobre estas, o que torna o conhecimento uma questão de construção. A pesquisa é também um processo em que o conhecimento é construído por meio de interpretações que devem ser fundamentadas em fontes de pesquisa; as conclusões às quais o pesquisador chega são parte do saber a ser continuamente interpretado, debatido e revisto pelas sociedades humanas, trabalho este que deve estar baseado, obrigatoriamente, nos paradigmas científicos conhecidos.

2- Para você, qual a contribuição da pesquisa enquanto princípio educativo para a prática pedagógica do professor?
R: Penso que através da pesquisa o professor poderá levar para a sala de aula novas descobertas realizadas no campo da pedagogia a serem colocadas em prática (caso se façam pertinentes e possibilitadores de bons resultados; para se fazer essa avaliação, as pesquisas precisam ser postas em discussão com coordenação e corpo docente, bem como eventualmente testadas em sala de aula). Descobertas científicas referentes a outros campos do saber igualmente podem ser debatidas com os alunos, pois são instrumentos a mais no processo de construção do conhecimento.

3- Qual a concepção sobre a utilização de materiais didáticos em sala de aula e qual a importância deles no processo educativo dos alunos?
R: Todo material didático serve de apoio e referência na construção do conhecimento. O cuidado a ser tomado é não ficar restrito a um único tipo de material, nem tratá-lo como se fosse um depósito de Verdade sem que se façam necessárias interpretações e reflexões sobre as informações trazidas por esses materiais. No campo das Humanas, as análises trazidas por um livro ou qualquer outra forma de comunicação, decorrem dos condicionamentos intelectuais do autor e, a despeito do compromisso com a verdade por parte deste autor, não se pode ter a pretensão de ser o dono da Verdade. O essencial é que toda análise e toda reflexão devem ser dotadas de argumentação sólida e referências científicas.

4- Cite alguns materiais didáticos disponíveis em sua escola.
R: São usados sobretudos livros e filmes. Para as disciplinas específicas que leciono (História e Geografia), também faço bastante uso de mapas, imagens e, quando possível, de artigos veiculados na imprensa.

5- Como você utiliza os materiais didáticos em sala de aula? (constrói com os alunos, leva material pronto, solicita que os alunos levem materiais para enriquecer a aula e o conteúdo, utiliza os recursos disponíveis na escola? Qual (is) disciplinas(s) utiliza (m) mais materiais didáticos?; justifique o motivo.
R: Utilizo de todas essas estratégias. Como se pode inferir pelas respostas anteriores que dei, procuro sempre orientar os alunos a interpretarem as informações contidas nos mais diversos materiais didáticos. Até mesmo com relação aos livros didáticos, que são materiais prontos, busco orientar os alunos que aquilo que os livros contêm é resultado de interpretações de autores que escreveram tais livros, bem como das fontes utilizadas para escrevê-los. De acordo com minhas referências intelectuais e no âmbito das disciplinas que leciono, procuro sempre tomar o cuidado de não cair num relativismo absoluto, ou seja, as interpretações não são meros pontos de vista, meros achismos, pelo contrário, são resultado de ampla pesquisa, documentada e defendida com sólidos argumentos. Sendo assim, é necessário estudar e discutir detidamente as diversas interpretações buscando analisar as que são mais válidas, as que são parcialmente válidas e as que são de fácil refutação. Esse processo, repito, se faz a partir da interação professor-aluno. Não posso afirmar nada sobre disciplinas do campo das Exatas e Biológicas, mas no que se refere às Humanas, acredito que usar uma boa variedade de materiais didáticos é muito importante, justamente para possibilitar ao aluno o contato com interpretações diferentes. O problema é que dependendo da linha pedagógica de uma deteminada escola, o professor fica restrito a um livro que ele precisa terminar ou uma apostila cuja dinâmica se faz aula por aula.

6- Você promove/promoveu adaptações em materiais didáticos diante de necessidades educacionais especiais de algum aluno ? Qual (is)? Como foi esse processo?
R: Não só em virtude de necessidades especiais de algum aluno, mas muitas vezes na tentativa de facilitar o entendimento promovi adaptações, sobretudo no que se refere ao vocabulário (algo em relação ao qual os jovens de hoje apresentam imensa dificudade, sendo preciso tempo, trabalho e muita paciência para que eles adquiram um repertório mais amplo). Em outros momentos, quando percebi que havia possibilidade de forçar e fazer com que os alunos aprofundassem algum tema, igualmente adaptei tentando tornar as coisas de modo a exigir mais deles, criando por exemplo, questões extras em cima de algum texto, ou trazendo um autor de interpretação diferente para dialogar com o que já constava do material didático. É muito difícil prever de antemão se tais adaptações darão certo ou não, o que depende de uma enorme gama de fatores, alguns deles meramente casuais. Eu diria que costuma ser proveitoso em aproximadamente 70% dos casos.

Estas foram as primeiras questões que respondi. Posteriormente, outras foram propostas, como se segue:

7- Apresente as definições de educação, ensino e pesquisa e estabeleça uma articulação sobre a importância dessas ações para a atuação do professor no contexto educacional.
R: Educação: processo de formação de competências e habilidades, bem como de formação ética e moral do aluno, envolve ainda a troca de experiências e o debate sobre o conhecimento na interação entre professor e aluno; Ensino: transmissão de informações, orientação e reflexão sobre como lidar com as informações transmitidas no sentido de aproveitá-las no debate sobre o conhecimento; Pesquisa: geração de conhecimento a partir da problematização de fontes de pesquisa e obtenção de conclusões/interpretações.
O professor deve ser, além de um transmissor de informações, principalmente um orientador que capacitará o aluno a refletir sobre as informações, fazendo com que este entenda que informação é matéria-prima na produção do conhecimento. O professor pesquisador, em tese, está bem capacitado a ensinar, já que fará com que os alunos diferenciem informação de conhecimento e a relação existente entre ambos. A pesquisa é importantíssima nesse contexto, pois por meio dela o conhecimento é produzido e colocado em debate na sala de aula. A partir disso, tem-se a meu ver, os fundamentos para uma educação completa, que deve contemplar competências e habilidades, mas também a formação do cidadão, algo que só pode ser alcançado com debate sobre o conhecimento já produzido, oferecendo ao aluno uma bagagem cultural e universal que lhe tornará a apto a entender e interagir com a realidade que o cerca. É também partindo daí que o aluno pode ter sua curiosidade despertada para que ele próprio realize pesquisas e possa contribuir produzindo algum conhecimento.

8- Para você, de que maneira os recursos didáticos foram evoluindo ao longo da história da educação?
R: Pensando especificamente na minha área de docência, creio que os recursos didáticos estão bem mais atraentes e otimizados em termos visuais. São muito mais ricos em iconografia e variedade cartográfica do que eram quando eu fui estudante, há cerca de 20 ou 25 anos. Mais recentemente, muitos recursos integraram a tecnologia como meio de transmissão de informações mais precisas e atraentes para um público já nascido sob a influência da Revolução Tecnológica e da Nanotecnologia.
No entanto, considero um equívoco acreditar que haja uma evolução, em sentido lato, dos materiais didáticos apenas porque estão mais atraentes no quesito visual ou mais afinados com novas tecnologias. Penso que muitos materiais didáticos são totalmente comprometidos pelo dogmatismo e pelo exacerbo ideológico. Na minha área, por exemplo, o marxismo ainda é, inúmeras vezes, tratado como Verdade única e como chave incontestável para a resolução dos problemas da humanidade, mesmo com a enorme quantidade de falhas grotescas já exaustivamente discutidas e apontadas presentes em uma teoria que se pretende profética e enxerga o desenrolar histórico como uma necessidade pré-definida pelos seus próprios parâmetros, o que ao longo do último século e meio vem se mostrando cada vez mais uma tremenda falácia. São raríssimos os autores que se preocupam, por exemplo, em discutir o capitalismo não como um sistema que engolfa todo o resto das dimensões sociais, mas como uma das dimensões possíveis de uma determinada sociedade, e que depende das outras - política, cultura, história, mentalidade - para funcionar de um modo ou de outro. Mais um exemplo é a visão a respeito da ditadura castrista em Cuba, em muitos casos considerada um modelo a ser louvado e adotado em outras localidades. Não é possível ver nisso nada além de pura contaminação ideológica, extremamente abjeta. Há aspectos que podem e devem ser colocados em debate, não uma ditadura, algo a ser condenado independentemente de espectro político.

9- Escreva um texto apresentando a pesquisa enquanto princípio educativo enfatizando a atuação do professor pesquisador.
R: Como exposto na questão 7, é por meio da pesquisa que se produz conhecimento. Assim sendo, o professor pesquisador está capacitado a levar o conhecimento produzido para o interior da sala de aula. Lá esse conhecimento será colocado em debate e confrontado com outras interpretações. Neste processo, o professor deve fazer com que os alunos entendam os argumentos que norteiam uma pesquisa e criem, eles mesmos, argumentos capazes de defender ou refutar as diferentes interpretações, sem doutriná-los na preferência por alguma delas. É então o aluno, que trabalhando e refletindo a partir do que é trazido pelas pesquisas, se tornará sujeito do conhecimento, sendo capaz de lançar argumentos existentes ou próprios em defesa de sua posição. O trabalho de pesquisa é importante porque mostra ao aluno que o conhecimento não está pronto e depositado em um "baú" de onde se retira alguma Verdade definitiva, mas que, ao contrário, as interpretações, quando solidamente argumentadas, contribuem para construir verdades (com v minúsculo) que atuam como "tijolos" na composição de um imenso "painel" que faz parte da cultura humana. É daí que o aluno se torna sabedor de que informações não são o conhecimento em si, mas apenas matérias-primas a partir das quais o conhecimento é continuamente produzido, sendo necessária a filtragem e a reflexão em cima das informações. Tal processo pode contribuir ainda promovendo o gosto pela pesquisa e pelo conhecimento entre os alunos, quem sabe, (?) fazendo com que eles próprios ajudem na construção do conhecimento.


*OBS: evidentemente, a postura que assumo deve ser entendida exclusivamente no âmbito da minha área de docência, as Humanidades; um professor de Exatas, por exemplo, certamente terá uma perspectiva teórica e pedagógica diferente em certos aspectos (ou em muitos), haja vista que os ramos do saber possuem especificidades que precisam ser consideradas para que o processo educacional se conduza da melhor maneira em cada disciplina.

Sempre que possível, tento orientar minha prática docente segundo tais bases, porém, há entraves sérios e de difícil superação que viciam a estrutura educacional brasileira, algo que começa no Ensino Superior, de onde sai um grande número de professores que doutrinam os alunos. A universidade é o centro formador de docentes e, uma vez que a universidade brasileira, na maioria dos casos, se encontra assolada pelo marxismo, pelo pós-modernismo (não mais do que uma derivação do marxismo) e pela ideologização socialista, pensar em uma educação democrática, interpretativa e universalizante (no sentido da complexidade do conhecimento, da liberdade e da moral), é o mesmo que arar no deserto.

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